quinta-feira, 14 de outubro de 2010

GUILLOT,Gérard. O resgate da autoridade em educação; tradução Patrícia Chittoni Ramos Reuillard. Porto Alegre: Artmed, 2008. 192 p.

RESENHA CRÍTICA
GUILLOT,Gérard. O resgate da autoridade em educação; tradução Patrícia Chittoni Ramos Reuillard. Porto Alegre: Artmed, 2008. 192 p.
O AUTOR :GÉRARD GUILLOT é professor de Filosofia na Universidade de Lyon, França.Atualmente escreve livros e artigos na área de Sociologia da Educação.
SÍNTESE DA OBRA:
O livro é constituído de três partes, onde o autor analisa a problemática do resgate da autoridade em educação enfocando os seguintes temas: O sentido da autoridade; por que a autoridade educativa está em crise? E por último, o autor faz um apelo por uma autoridade dos bons tratos.
PRINCIPAIS TESES DESENVOLVIDAS NA OBRA:
Na primeira parte, Guillot inicia sua reflexão abordando o sentido, o significado e as referências da palavra autoridade, neste tema ele expõe de forma conceitual e analítica as diversas nuances históricas, sociológicas, filosóficas e psicanalíticas que a palavra autoridade carrega em seu bojo. O autor consegue ainda de forma interdisciplinar dialogar com outros pensadores como Lacan, Focault, Neill dentre outros. Várias análises de atitudes e posturas são feitas, tais como: não sentir por si mesmo, cuja premissa reside no fato de desconfiar do próprio corpo, ou seja, o corpo e as emoções da criança como constituintes de uma problemática projetiva e forte, é como se o corpo da criança, suas sensações, suas emoções, só pudessem existir e adquirir sentido sob o ditado educativo do adulto. Não pensar por si mesmo, e sim reconhecer o desejo da criança. O autor vai ainda mais longe, ao afirmar que nem todo desejo é necessariamente aceitável e o reconhecimento dos desejos de uma criança por parte dos adultos não os tornam seres permissivos, pois o papel do adulto nessa relação é o de aprovar ou desaprovar um comportamento e não uma pessoa. Para ele, aquilo que alguém faz, em um dado momento não o condena a ser identificado em sua pessoa pelo julgamento feito sob seus atos, mesmo que ele seja positivo. Somos convidados a praticar a autoridade que constrói, distinguindo o ser e o fazer, o respeito e a tolerância. Ao término da primeira parte, o autor suscita ainda, a questão e função do interdito: segundo ele, os pais ou professores não devem proibir uma criança de existir, mas, ao contrário,fazê-la tomar seu direito inalienável de existir e de ser respeitada como pessoa. Todavia, jamais devemos esquecer que autorizar alguém a ser não implica absolutamente autorizá-lo a fazer qualquer coisa. Para que uma criança construa sua identidade, ela precisa de referências, de um enquadramento e, portanto, de proibições. O interdito é assim estruturante da liberdade a ser conquistada.
Na segunda parte do livro, o tema abordado é: Por que a autoridade educativa está em pane?Guillot analisa as mudanças de paradigmas e as dissonâncias entre as vozes daqueles que escrevem e falam sobre educação na atualidade. Para ele, não são mais os adultos os modelos de identificação e autoridade, e sim são os adolescentes e seus pares, vivemos segundo ele, uma sociedade “adolescêntrica”. O imediatismo, o economicismo, a precipitação pela novidade são fontes do que ele chama de “gulodices do momento”. Essa mudança coloca o adulto em um déficit de autoridade, tornando cada vez mais difícil motivar aprendizagens e maturação para uma temporalidade longa. O autor acredita também que desde a Segunda Guerra Mundial e suas atrocidades, autoridade passou a ser sinônimo de autoritarismo nas representações coletivas, e hoje, muitos rejeitam a autoridade, querendo com isso, se afastar de um possível autoritarismo. A conseqüência deste equívoco foi o fato da autoridade educativa ter se apagado diante das pulsões mais jovens transmutadas em ícones de liberdade. Diante de todas essas constatações Guillot faz os seguintes questionamentos: qual o papel do professor em nossos dias? O que fazer diante de uma heterogeneidade de alunos?É preciso, até onde e como, dar provas de autoridade sem cair no autoritarismo?É preciso, até onde e como, negociar sua autoridade?Com o intuito de lançar mais luzes sobre a pane da autoridade educativa, Guillot apresenta de forma ilustrativa uma tipologia dos estilos de adultos encontrados em nossa sociedade. São cinco grandes tendências, a saber: o adulto “captador”. Aquele que acredita saber o que seu filho deseja ou teme, e decide em seu lugar. Neste caso o filho cativado se torna de fato cativo. O segundo é o adulto “fusional” este tipo não recorre a autoridade, mas conta com uma cumplicidade recíproca de papéis.Busca o efeito espelho e acredita que seu filho é igual a ele, e por isso, a criança deve se projetar no desejo do adulto.O terceiro é o adulto “ dogmático”, é alguém que pensa ter sempre razão, é aquele que comanda, pois “sabe” o que é bom para a criança:conflito ou não ele dará sempre a última palavra.A criança obedece, senão é punida. O quarto é o adulto indiferente, tem como característica não querer problemas, por isso, não se envolve em conflitos com as crianças. Por fim, temos o quinto e último adulto dessa tipologia que é o adulto “adulto”: Este é aquele que segundo o autor, pratica a autoridade que constrói: mantem-se a uma boa distância psicológica da criança que não é nem de frieza distante,nem de hierarquia altiva,mas de respeito de autoridade e de amor.Todos esses estilos aqui apresentados pelo autor, são produtos das relações evolutivas dos processos familiares de nosso tempo, que tem como impacto a fragilização do vínculo integracional, a confusão de papéis na família, que ele chama de triunfo do adolescentrismo.Após toda essa discussão o capítulo é finalizado com uma análise de qual é o papel da escola, bem como sobre a evolução do professor como um ser que ensina diante da heterogeneidade existencial e física do nosso tempo, apontando caminhos para uma pedagogia da parceria.
Na terceira e última parte, o tema tratado é: Por uma autoridade de bons tratos. Apesar de aparentemente simples, os bons tratos, segundo Guillot, não tem formas especiais que possam ser listadas; é algo uno e global. Para ele, uma autoridade de bons tratos não se limita a uma caridade indulgente. Implica sim, em uma atitude ativa, responsável, cotidiana e respeitosa. Se o respeito é a condição fundamental de uma autoridade de bons tratos, estes devem se encarnar, segundo ele, em práticas educativas conforme os contextos considerados. Neste sentido, é importante perceber que autoridade e credibilidade andam juntas, pois a existência de um contrato pedagógico depende, sobretudo, do reconhecimento da palavra do outro, a do aluno principalmente. Isso só será possível se praticarmos a ética da autoridade. Uma autoridade ética para o autor supõe evidentemente uma ética da autoridade. Autoridade não é um poder sobrenatural nem uma projeção de receios ou interesses. É, segundo ele, uma maneira de conduzir o caminho da construção pessoal, graças ao qual nos tornamos capazes de autorizarmos a nós mesmos para viver com os outros no respeito ás leis e aos valores fundados de uma humanidade pacífica e sem exceção.
Ao final o autor conclui que: o princípio da autoridade e o da laicidade, são princípios da razão, são geradoras de liberdade. Educar é exercer uma autoridade de bons tratos. A autoridade do saber,ainda que arruinada pelo reino da “informação”,não pode ser autoridade sem a autoridade do professor. A autoridade do respeito ao humano e às leis, supõe o respeito à autoridade do professor, não em sua subjetividade, mas em seu status e no exercício de sua função. Ela supõe também que todos os adultos parceiros assumam uma autoridade de bons tratos no cotidiano.
CRÍTICA DO RESENHISTA:
A obra de Guillot nos fornece subsídios teóricos e práticos sobre a problemática da autoridade em educação. A relevância desta obra está no fato de se ocupar com uma temática extremamente importante para a realidade educacional de hoje. Ao trazer para a discussão a questão do resgate da autoridade em educação, o autor contribui de forma didática e relevante para a reflexão sobre a temática proposta. Quando aborda o sentido da autoridade, demonstra autonomia e profundidade epistemológica para dialogar com as demais áreas do conhecimento que também tem na questão da autoridade seu objeto de investigação. Em termos de linguagem, faz de sua reflexão um diálogo aberto sem contradições com aquilo que pensa e aquilo que escreve no livro. Tem consciência da abrangência do tema e, por isso mesmo, faz opções claras e bem fundamentadas, sem prejudicar a criticidade da sua obra, que mesmo tendo como contexto geográfico a educação francesa, não perde seu caráter universal e atual.
O autor mostra competência e clareza metodológica na construção dos argumentos que demonstram porque a autoridade educativa está em pane, merecendo um destaque especial para a discussão sobre o medo do autoritarismo, e a evolução do papel do professor. Há uma consistência interna em termos de referencial teórico que vai sendo construído de forma sistemática e está presente em todos os capítulos do livro.
Finalmente concluímos que esta obra requer do seu leitor um razoável conhecimento das Ciências Sociais e Humanas, além é claro, de prévias leituras sobre a temática em questão. Sua natureza e seu caráter pedagógico fazem com que sua indicação esteja voltada principalmente para educadores, pesquisadores e demais profissionais das Ciências Sociais.


Ranieri Roberth Silva de Aguiar é Licenciado em filosofia, mestre em Educação e Teologia: educação comunitária para infância e Juventude pela EST e aluno especial do programa de doutorado em educação da Universidade Católica de Brasília. Trabalha desde 2001, na Fundação Educacional do Distrito Federal como professor de Filosofia e Sociologia no ensino médio.

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